Camiseta pra mim e body pra Tarsila.

No foto-zine VINTE VINTE, o fotógrafo Bruno Stuckert e eu propomos uma reflexão sobre 2020. A narrativa ressalta a antítese entre os privilégios que dividem a sociedade e os sentimentos que colocam toda a humanidade navegando no mesmo barco.
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SINOPSE:
Tem quem fale que 2020 nem começou, mas a humanidade não pode esquecer nenhum desses dias intermináveis de perdas, angústias e dores.
Não há o que romantizar no que aconteceu nesse ano que nunca chega ao fim.
Pessoas morrem aos montes do outro lado do muro, enquanto tentamos minimizar os impactos na nossa sanidade mental.
Crianças passam fome na ocupação do lado da nossa casa, enquanto a convivência diária extrema ao mesmo tempo nos desgasta e nos fortalece enquanto casal.
Uma mulher embala seu filho recém-nascido fumando um cigarro no lixão, enquanto a gente sofre um aborto no nosso apartamento.
Será que passamos mesmo pela tal data limite que Chico Xavier previu para sermos resgatados pelos extraterrestres? Ou será que estamos ainda presos nas trevas de 2019?
Parece que ano passado morremos e agora estamos perdidos em um dos 9 andares do inferno da Divina Comédia de Dante.
Atualizado: 26 de jan. de 2021
Eu e Bruno temos notado uma constante nas reações das pessoas desde que ELE RESOLVEU CONTAR PRO MUNDO DA NOVA GESTAÇÃO.
Basicamente, a galera tem sempre uma péssima notícia para dar sobre essa jornada que se inicia.
É assim:
_ Está enjoando, Paulinha?
_ Estou sim.
_ Então prepara pra azia que é muito pior.
_Vai ser papai, Bruno?
_ Vou sim.
_ Já viu o preço da mensalidade da escola?
_ Estão grávidos?
_ Estamos sim.
_ Aproveitem pra dormir agora.
Ontem, fiquei animada porque percebi minhas unhas crescendo bonitas e resolvi perguntar no Instagram se era obra da gravidez.
Descobri que sim e, também, que tudo acaba no pós parto.
“Vai cair tudo.”
“Depois do parto fica muito pior.”
“Prepara pro puerpério.”
Fico pensando aqui o que será que leva essas pessoas a serem tão desanimadoras com alguém que elas nem sabem como está passando pela gravidez.
Veja bem, sou uma grávida ansiosa e depressiva, cheia de medos porque acabou de perder um neném e que está tentado descobrir a alegria desse momento.
Por enquanto vivi algumas coisas ruins e agora cheguei num estágio que não sinto mais as coisas direito. Parece que perdi a minha intensidade. Estou numa fase que não é nem bom, nem ruim. É um estado neutro.
Não tenho barriga. Não enjoo mais. Tô bem lesada e não sinto nada além de sono e fome.
Uma pequena felicidade de uma unha que cresce forte e bonita me deixa animada.
Opa. Tem uma coisa maneira começando a acontecer.
Daí, vem a tal da rede de apoio e me diz:
_ Não se iluda. Gravidez é um merda mesmo.
É uma rede de apoio ao contrário. Parece que essas pessoas foram tão iludidas com uma visão romantizada da gravidez que ficaram frustradas com a realidade.
Elas pensavam que iam acordar com passarinhos cantando na janela e não iam sentir dor com um útero tomando todo o espaço que antes era ocupado pelas suas vísceras?
Tem alguém se alimentando do meu sangue pra poder crescer dentro de mim, caralho. A parte ruim eu já estou vivendo, me deixa ter um pingo de alegria com a parte boa.
Ninguém se prepara pra uma azia. Eu só fico mais ansiosa pensando que já que o enjoo passou, a qualquer hora vai chegar a porra da azia.
Ninguém vai tomar um citotec porque a escola tá cara.
Ninguém guarda o descanso de um sono da tarde num potinho pra poder abrir quando a criança acordar pela 4ª vez na madrugada.